21.1.15

// "A surfar no Porto desde 2014" por Miguel Guedes //





"A surfar no Porto desde 2014"


"Não me espanta, não me indigna, não me enfada porque já não espero verdadeiramente outra coisa. A forma coloquial como o secretário de Estado do Turismo, Adolfo Mesquita Nunes, convoca para si os louros do crescimento do turismo no Porto e no Norte do país não mais é do que um sinal desse subdesenvolvimento menor e tacanho que faz com que o provincianismo cresça, invernoso, em algumas mentes iluminadas do poder na capital do país. Essa noção tão pequena de que fora do centro do Mundo nada e de que para o centro do Mundo tudo, até a firmeza e a responsabilidade das suas gorjetas. Nunca assumindo o pecado original. O centralismo que António Costa recolocou em cima da mesa como argumento a favor da regionalização pode ter em Adolfo Nunes um bravo porta-voz turístico, aquele que anuncia as paragens regionais e os números da consagração da província. O Norte já é visitado, interpretado e revisto. E tudo graças à visão da sua política regeneradora. O secretário de Estado do Turismo devia aparecer na província mais vezes. Perceberia a coragem e o esforço de quem lá vive, aqueles que não se vangloriam pela descoberta do mapa da mina. Tudo o que verdadeiramente vale e faz crescer está nas pessoas que recortam os seus dias sem olhar as outras pessoas de lado ou por cima dos ombros. Olhos nos olhos com o destino. Neste caso, turístico.É uma questão de aparecer. Quando o secretário de Estado afirma, sem se rir, que "o turismo no Porto e no Norte estava a estagnar e, de repente, disparou a partir do ano de 2013, depois de termos iniciado esta nossa estratégia", a gargalhada só pode ser geral na província. Note-se, "de repente"... É uma questão de aparecer mais vezes para se rir connosco, Sr. Secretário de Estado. Rui Moreira caracterizou-o com a frase "palavras para quê, é um artista português" mas, como é óbvio, o presidente da Câmara do Porto tem os artistas em bem melhor conta como se pode perceber pela política cultural camarária. O seu a seu dono: Adolfo Nunes decepou os subsídios a eventos para "direccionar os apoios para aquilo que efectivamente tem possibilidades de atrair turistas". Uma espécie de caça às moscas, portanto. Menos mal, erradicou o subsídio para o evento dos popós no Circuito da Boavista, prestando um bom serviço - porventura, sem o saber, ao munícipe portuense. Se essa foi a sua estratégia, muitos parabéns. Se bem que desconfio que o verdadeiro motivo residiu na barulheira dos escapes. Aposto que até se ouvia em Lisboa, um horror.O centralismo, do qual Adolfo Nunes é agora jactante cabeça de proa, faz surf na maionese. Sem pensar se mete água, refere que o essencial para o sucesso do nosso destino turístico tem sido "o dinamismo do sector privado do surf". Sem negar as nossas habilidades com prancha e a valorização deste sector como referência, convém lembrar que o turismo que mais tem crescido em Portugal é o de cidade, o da cultura, do lazer e do monumental. Os indicadores para 2014 anunciam um recorde de dormidas de estrangeiros na Região Norte. A cidade do Porto foi o destino mais procurado pelos portugueses na passagem de ano (e quem lá esteve assegura que a Torre de Babel foi uma das realidades da noite, não me parecendo que todos os portugueses sejam assumidamente poliglotas especialistas ou sobreviventes ao dilúvio retratado no livro de Gênesis). O Porto foi considerado o melhor destino europeu de 2014 e Rui Moreira fez capa do "New York Times", assim como páginas do "El País", do "Libération" e de publicações especificamente relacionadas com o turismo e o seu desenvolvimento. A importância e multivalência do Douro Vinhateiro cresce a cada dia, com redes de aproximação entre focos de lazer, conhecimento e cultura. Mas Adolfo Mesquita Nunes surfa na sua estratégia "repentina" do ano transacto para, até aqui, nos ensinar como fazer as coisas bem, feitas em pouco tempo ou até... de repente.Ocrescimento do turismo em Portugal, ao ponto de recebermos mais turistas por ano do que a nossa população real, é um esforço de todos. É uma questão de estratégia, de esforço, de visão. Do saber, da nossa cultura, do saber receber. "Dar e receber", como um dos álbuns de António Variações. Esse sim, um artista português (entre o Minho e New York, como gostava de se descrever). Essa visão cosmopolita, mundividente, essa razão pela qual somos um país feito de pessoas que não se revêem na visão estratégica e nas esmolas do pensamento único do poder central. Um país com regiões que surfam, obviamente. Mas que têm a sua onda."


Palmas por favor .


lots of love,
MLM

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